"Se me dói tanto que as coisas passem/é porque em mim cada instante foi vivo/na luta pelo bem definitivo/que as coisas de amor se eternizassem." [sophia]
domingo, 7 de novembro de 2010
meu acaso numa fracção.
A tua dor tem olhos verdes e países dentro.
[numa fracção de tempo, Barcelona]
A fotografia da tua dor começa num início de tarde, e tem uma mesa de madeira para dois, uma esplanada sobre um jardim e um tempo abafado [“(…) transbordante de apelo e de espera/mas donde nunca nada veio (…)”].
Havia uma artéria de carros ao lado, numa das avenidas mais concorridas da cidade. Havia o caos das telas de Vieira da Silva e dos poemas de Sophia.
Mas o caos, nessa tarde, foi só o país ao lado do país que habitaram.
[“(…)Somos estrangeiros onde quer que estejamos (…)”]
As palavras foram criadas no momento, sem presente nem passado.
[numa fracção de tempo, inundou-a de saudades de futuro]
De onde vinha o riso? De onde os silêncios que se continuavam?
Os universos não se conheciam, mas ouviram os filmes essenciais e viram as músicas essenciais. Por isso, conheciam-se.
[numa fracção de tempo, a esplanada deixou entrar a costa italiana, as ilhas eólias, as vilas piscatórias, Mario Ruoppolo, Salvatore e Dickie Greenleaf]
Mas a memória dela não tem só palavras. A memória dela persiste no inverno que sobreveio porque tem sobretudo não-palavras.
[“Já gastamos as palavras pela rua (…)”]
Para onde o acaso numa tarde de promessa?
Pode o início consumir o início e a perfeição esgotar-se no seu prelúdio?
[numa fracção de tempo, a vida]
N.b.: Pela ordem em que surgem no texto, citações de sophia m.breyner, ricardo reis e eugénio de andrade. Pintura de van gogh.
5 comentários:
Anónimo
disse...
"Os universos não se conheciam, mas ouviram os filmes essenciais e viram as músicas essenciais. Por isso, conheciam-se."
"Mas a memória dela não tem só palavras. A memória dela persiste no inverno que sobreveio porque tem sobretudo não-palavras."
Como tu descodificas o que não é sequer perceptível, joana reis. Como me revejo nisto. Como nos revejo nestas sensações.
5 comentários:
"Os universos não se conheciam, mas ouviram os filmes essenciais e viram as músicas essenciais. Por isso, conheciam-se."
"Mas a memória dela não tem só palavras. A memória dela persiste no inverno que sobreveio porque tem sobretudo não-palavras."
Como tu descodificas o que não é sequer perceptível, joana reis. Como me revejo nisto. Como nos revejo nestas sensações.
E tu, como sempre, pasmas-me com as tuas "palavras diamantes" :)
muito obrigada, leitoras minhas, que sabem sentir o fundo destas fracções.
a minha dor tem olhos azuis..
Leio e releio...brutal, é pouco!
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