quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

O fado salvou Lisboa.




O fado salvou Lisboa da Lisboa impessoal e fria.
O fado agarrou Lisboa pela cintura, descalçou- a e deixou-a trilhar sozinha os caminhos de Alfama.

Passear sozinha pelas casas de puro branco dourado 
pela luz antiga dos candelabros
Ouvir sozinha as vozes roucas de vida.
E a senhora que espanta solidões com o seu xaile vermelho.

Lisboa sentou-se sozinha entre as mesas fechadas sobre sete quadrados de chão.
E ouviu as guitarras trinando a melancolia que é de todos, e a saudade que a todos corrói.

Como sabes tu, fado-madragoa, trazer nos teus versos essa dor que é a minha?
Como sabes tu, guitarra portuguesa, dedilhar os acordes da inquietude que me devora?


Lisboa ficou pela noite dentro:

os dedos enlaçando meio copo de vinho,
tinto como os lábios de quem canta,
os ombros e o pescoço deambulando
num movimento suave
que sacode o fatalismo
 de uma sina qualquer.


Lisboa foi buscar às casas de fado o humanismo que perdeu na imensidão.

Recupero na roda humana
que envolve a fadista de voz salgada
e as guitarras quentes,
essa simplicidade, esse bairrismo,
que tantas vezes de mim voa,
Porque vejo nos olhos dos outros
como são também os meus
e como cada corpo embala no fado
o sentimento que o atordoa.





Fotografia: "Escadinhas de Alfama", por Francisco Salgado Dias (no blogue http://salgadodiasarte.blogspot.com/)

3 comentários:

Me, Myself and I disse...

Textos destes são património de Humanidade (e não da Humanidade que nem sabe onde fica Portugal) :)
O Fado é nosso e de quem gosta dele.O reconhecimento dos outros vale uns trocos e pouco mais.
Mistral quero mais textos.
E 2012 cheio de mais alma.

Annie disse...

:)

Helena Trigueiros disse...

Ter uma filha a gostar da alma dos portugueses e a exprimi-la tão bem,é um duplo privilégio.

Alameda de Tílias